segunda-feira, 12 de julho de 2010

Torrando o café

A torrefação é um processo piro lítico (induzido pelo calor) que amplia a complexidade química do café. O aroma do café verde contém cerca de 250 espécies moleculares voláteis diferentes, enquanto o do torrado possui mais de 800. Quando submetido ao aquecimento gradual de uma torrefadora (basicamente um grande cilindro rotatório quente), a água residual dentro de cada célula é convertida em vapor, que promove várias reacções químicas complicadas entre a cornucópia de açúcares, proteínas, lipídeos e minerais contidos no seu interior. Sob temperatura alta, entre 185 e 240 graus Celsius, os açúcares se combinam com aminoácidos, peptídeos e proteínas, de acordo com um conhecido processo de caramelização chamado reação de Maillard. Os produtos finais são glicosilamina e melanoidinas, marrons e agridoces - que dão o gosto dominante do café -, junto com dióxido de carbono (até 12 litros por quilograma de café torrado). Simultaneamente, uma vasta gama de moléculas aromáticas menores emerge; esses compostos voláteis dão ao café sua fragrância familiar. A pressão no interior de cada célula aumenta para até 20 a 25 atmosferas, à medida que o vapor e o dióxido de carbono tentam escapar, mas acabam presos por paredes celulares grossas e pouco porosas, além de uma camada de óleo. Algumas células explodem, provocando os estouros característicos do café sendo torrado.
Durante a torrefação, o volume do grão de café aumenta em 50% ou mais, enquanto a massa do grão diminui em um quinto. Dependendo das temperaturas e dos procedimentos aplicados, o processo de torrefação pode durar de 90 segundos a 40 minutos. Doze minutos é a duração tradicional. A termodinâmica das reações intracelulares varia de acordo com o tempo de torrefação, assim como o resultado final. Um tempo curto, que requer uma grande quantidade de energia térmica, minimiza a perda de peso, mas dá ao café um amargor metálico devido à presença de polifenóis que não tiveram tempo para reagir apropriadamente. Períodos longos de torrefação, usados freqüentemente em países mais pobres, onde muitos consumidores só podem comprar grãos defeituosos e baratos, expulsam todas as fragrâncias e os sabores indesejáveis. Infelizmente, os gostos e aromas também se perdem, deixando o café amargo.
Quanto mais alta a temperatura final da torrefação, menos desejável será o aroma e mais forte o amargor. Da mesma forma, temperaturas de torrefação baixas não desenvolvem inteiramente aromas desejáveis. Nesse caso, a acidez pode predominar.
Cheirando o café
A CIÊNCIA DO AROMA é extremamente complexa. Os pesquisadores costumam analisar as fragrâncias que surgem durante a torrefação dos grãos de café por meio da cromatografia a gás aliada à olfatometria, quando provadores treinados aspiram e definem o cheiro de cada elemento reconhecível. A espectrometria de massa é então aplicada com freqüência para identificar a composição química de cada odor. Cheirar os aromas de café torrado que foram fracionados por um cromatógrafo de gás é uma experiência interessante: pode-se reconhecer os aromas de rosas, de chá de Darjeeling, de chocolate, de baunilha e de violeta, assim como os de trufas, sopa, queijo, suor e até mesmo o que é chamado de cheiro de gato que, se diluído, lembra o do vinho Sauvignon Blanc. Mas, numa amostra concentrada, é repugnante.
A diluição do aroma do café é análoga: depois de um determinado ponto, apenas os compostos mais fortes são percebidos. Infelizmente, as moléculas mais fortes no cheiro de uma amostra de café são aquelas provenientes de grãos defeituosos.
Moléculas como o etilbutanato e etilglicolato, responsáveis pelo aroma desagradável dos grãos imaturos, arruínam uma xícara de café. Da mesma forma, moléculas de metiloborneol e tricloroanisol (TCA) produzem o característico cheiro de terra, química característica dos cafés robusta. O TCA, que também é chamado de Bebida Rio, porque foi descoberto pela primeira vez em cafés plantados ao redor do Rio de Janeiro, pode ser encontrado também em vinhos. Sua penetração no sistema olfativo humano é incrivelmente pequena - seis milionésimos de um bilionésimo de grama por mililitro.
O grande passo na transformação de grãos de café em uma xícara de expresso é a extração dos componentes ativos no café torrado e moído por água quente. A interação entre água quente e pó de café é, no entanto, sutilmente diferente quando se faz café de filtro normal e expresso. Quando o café de filtro é preparado, a água quente passa através de um agregado relativamente solto de pó de café de tamanho médio. Durante os quatro a seis minutos de contato com a água fervente, a maior parte das substâncias solúveis presentes no café torrado passa à solução. Assim, grandes quantidades de ácidos altamente solúveis e cafeína se dissolvem na xícara. Em contraste, o tempo muito mais curto de filtragem do expresso permite que menos ácido e apenas 60% a 70% da cafeína dissolvam-se na infusão.
Fonte: Scientif

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